Ao tomar uma decisão de menor importância, eu descobri que é
sempre vantajoso considerar todos os prós e contras. Em assuntos vitais, no
entanto, tais como a escolha de um companheiro ou profissão, a decisão deve vir
do inconsciente, de algum lugar dentro de nós. Nas decisões importantes da vida
pessoal, devemos ser governados, penso eu, pelas profundas necessidades íntimas
da nossa natureza. Se o desenvolvimento da civilização é tão semelhante ao do
indivíduo, e se usa os mesmos meios, não teríamos o direito de diagnosticar que
muitas civilizações, ou épocas culturais - talvez até a humanidade inteira - se
tornaram neuróticas sob a influência do seu esforço de civilização?“... [a
religião é] um sistema de doutrinas e promessas que, por um lado, lhe explicam
os enigmas deste mundo com perfeição invejável e que, por outro lado, lhe
garantem que uma Providência cuidadosa velará por sua vida e o compensará, numa
existência futura, de quaisquer frustrações que tenha experimentado aqui. O
homem comum só pode imaginar essa Providência sob a figura de um pai
ilimitadamente engrandecido. Apenas um ser desse tipo pode compreender as
necessidades dos filhos dos homens, enternecer-se com suas preces e aplacar-se
com os sinais de seu remorso. Tudo é tão patentemente infantil, tão estranho à
realidade, que, para qualquer pessoa que manifeste uma atitude amistosa em
relação à humanidade, é penoso pensar que a grande maioria dos mortais nunca
será capaz de superar essa visão da vida. Mais humilhante ainda é descobrir
como é vasto o número de pessoas de hoje que não podem deixar de perceber que
essa religião é insustentável e, não obstante isso, tentam defendê-la, item por
item, numa série de lamentáveis atos retrógrados. ”Não posso imaginar que uma
vida sem trabalho seja capaz de trazer qualquer espécie de conforto. A
imaginação criadora e o trabalho para mim andam de mãos dadas; não retiro
prazer de nenhuma outra coisa. Esta seria uma receita para a felicidade, se não
fosse a idéia terrível de que a produtividade da gente depende inteiramente de
nosso modo de sentir. Que há de ser da gente, quando os pensamentos cessarem de
aparecer e as palavras adequadas não se apresentarem? Não se pode deixar de
tremer diante de tal possibilidade. É por isso que, embora submetendo-me ao
destino como um homem honesto, não deixo de fazer secretamente a minha oração:
acima de tudo, que não surja nenhuma doença ou qualquer miséria física que me
paralise as faculdades da criação. Como dizia o rei Macabeth: "Morreremos
com as armaduras nos ombros"."
Ninguém escreve para ganhar fama, que, de qualquer maneira,
é coisa transitória, ou para atingir a imortalidade. Seguramente, escrevemos em
primeiro lugar para satisfazer alguma coisa que se acha dentro de nós, não para
as outras pessoas. É claro que, quando os outros reconhecem os nossos esforços,
a satisfação interior aumenta, mas, mesmo assim, escrevemos primeiramente para
nós mesmos, seguindo um impulso que vem de dentro. Privamo-nos para mantermos a
nossa integridade, poupamos a nossa saúde, a nossa capacidade de gozar a vida,
as nossas emoções, guardamo-nos para alguma coisa sem sequer sabermos o que
essa coisa é. E este hábito de reprimirmos constantemente as nossas pulsões
naturais é que faz de nós seres tão refinados. Porque é que não nos
embriagamos? Porque a vergonha e os transtornos das dores de cabeça fazem
nascer um desprazer mais importante que o prazer da embriaguez. Porque é que
não nos apaixonamos todos os meses de novo? Porque, por altura de cada
separação, uma parte dos nossos corações fica desfeita. Assim, esforçamo-nos
mais por evitar o sofrimento do que na busca do prazer.
Sigmund Freud
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