Immanuel Kant (1724-1804),
filósofo alemão, em geral considerado o pensador mais influente dos tempos
modernos, nasceu em Königsberg, atual Kaliningrado, em 22 de abril de 1724. Não
casou nem teve filhos, falecendo em 1804 aos 80 anos. Kaliningrado, situa-se
onde foi a Prússia Oriental, um território no litoral sul do Báltico, parte da
Rússia desde 1946.
O território da Prússia foi adquirido da Polônia por
Frederico Guilherme o Grande Eleitor de Brandenburgo de 1640 a 1688.
Em 1701, Frederico III de Brandemburgo teve permissão de Leopoldo I, Imperador
do Sacro Império Romano, para usar o título de Frederico I, rei da Prússia. Seu
filho, Frederico Guilherme I (1713-1740), formou um exército bem equipado (o
terceiro da Europa, depois da Rússia e da França) e levantou a economia do
reino principalmente com a indústria de lã com que vestia o exército. Casou com
Sofia Dorotéa, filha de George Luís, eleitor de Hanôver (O último dos três patronos
a que Leibniz serviu em Hanôver), que veio a ser George I da Inglaterra.
Frederico II, O Grande (1740-1786), sucessor de Frederico Guilherme, usou o
poderoso exército da Prússia para tomar a grande e próspera província da
Silésia à Áustria dos Habsburgo (1740), e sob seu reinado Kant viveu
a maior parte de sua vida, toda ela vivida em Königsberg.
Kant era filho de um artesão que
trabalhava couro e fabricava selas. Sua mãe, de origem alemã, embora não
tivesse estudo, foi uma mulher admirada pelo seu caráter e por sua inteligência
natural. Ambos seus pais eram do ramo pietista da Igreja Luterana, uma
subdenominação que requeria dos fieis vida simples e integral obediência à lei
moral.
A influência de seu pastor permitiu a Kant,
o 4o. de 11 crianças, porém o mais velho sobrevivente, entrar na escola
pietista, onde estudou por oito anos e meio principalmente os clássicos
latinos. Kant confessou a sua preferência de então pelo
naturista Lucrécio, e talvez o tenha impressionado o livro IV do poema De rerum
natura, onde Lucrécio descreve a mecânica dos sentidos e do pensamento.
Em 1740, aos dezesseis anos, Kant entrou
para a universidade de Königsberg onde estudou até aos 21 anos. Apesar de ter
assistido a cursos de teologia e até pregado alguns sermões, ele foi atraído
mais pela matemática e a física. Ajudado por um jovem professor, Martin
Knutzen, que havia ensinado Christian Wolff, um sistematizador da filosofia
racionalista, e que também era um entusiasta da ciência de Sir Isaac Newton,Kant começou
a ler os trabalhos deste físico inglês e, em 1744, começou seu primeiro livro,
o qual tratava de um problema relativo a forças cinéticas: "Ideias sobre a
Maneira Verdadeira de Calcular as Forças Vivas"
Aos 21 anos, apesar de estar decidido a seguir uma carreira
acadêmica, com a morte de seu pai em 1746 e o seu fracasso em obter o posto de
sub-tutor em uma das escolas ligadas à universidade, Kant se
viu obrigado a desistir temporariamente de seu projeto e a buscar meios
imediatos de se manter. Foi compelido a suspender os estudos universitários e
ganhar a vida como tutor particular. Durante nove anos manteve essa ocupação,
atividade em que foi bem sucedido e que lhe permitiu conviver com a sociedade
mais influente e refinada de seu tempo. Serviu a três famílias diferentes,
tendo nesse período viajado à cidade próxima de Arnsdorf. Em 1755 ele retornou
a Königsberg e lá passou o restante de sua vida.
Em 1755, ajudado pela bondade de um amigo, Kant pode
completar seus estudos na universidade. Obteve seu doutorado e assumiu a
posição de livre docente (Privatdozent, professor sem salário). Três
dissertações que ele apresentou na habilitação a esse posto indicam o interesse
e rumo de seu pensamento nessa época. Em uma, "Sobre o fogo", ele
argumenta, muito ao jeito aristotélico, que os corpos agem uns sobre os outros
através de uma matéria sutil e elástica uniformemente difusa que é a substância
básica de ambos calor e luz.
A seguir, por 15 anos ele ensinou na universidade, primeiro
dando aulas de ciência e matemática, mas gradualmente ampliando seu campo de
interesse a quase todos os ramos da filosofia. A Física newtoniana o
impressionou, não apenas pelas suas implicações filosóficas quanto pelo seu conteúdo
científico. Impressionou-o igualmente as asserções leibnizianas, as quais
criticaria no futuro.
A fama de Kant como professor e
escritor aumentou constantemente durante seus 15 anos como livre-docente. Cedo
ele já lecionava sobre muitos assuntos além de física e matemática, incluindo
lógica, metafísica, e filosofia moral. Até mesmo ensinou sobre fogos de
artifício e fortificações. A cada verão, por 30 anos, deu um curso popular
sobre geografia física. Ele gozou grande sucesso como professor: seu estilo,
que diferia grandemente daquele de seus livros, era humorístico e vivo,
vivificados por muitos exemplos de suas leituras em literatura inglesa e
francesa, viagem e geografia, ciência e filosofia.
Apesar de que as aulas e os trabalhos escritos nesses 15
anos como livre-docente estabeleceram sua reputação como um filósofo original,
ele não recebeu uma cadeira na universidade até 1770, quando foi feito
professor de lógica e metafísica, uma posição que manteve até 1797, continuando
nesses 27 anos a atrair grande número de estudantes para Königsberg.
O ensino não ortodoxo de religião de Kant,
baseado no racionalismo mais que na revelação, o colocaram em conflito com o
governo da Prússia e, em 1792, ele foi proibido pelo rei Frederico Guilherme II
de ensinar ou escrever sobre temas religiosos. Kantobedeceu
essa ordem por cinco anos, até a morte do Rei e então sentiu-se liberado dessa
proibição. Em 1798, o ano que se seguiu a sua aposentadoria da universidade,
ele publicou um resumo de seus pontos de vista religiosos.
Vida Sedentária
Apesar de que ele falhou duas vezes em obter uma cátedra em
Konigsberg, Kant recusou aceitar ofertas que o teriam
levado para fora, inclusive o professorado de literatura em Berlim, que lhe
teria dado grande prestígio. Ele preferiu a paz de sua cidade natal para
trabalhar e desenvolver sua própria filosofia. Sua filosofia crítica brevemente
estava sendo ensinada em cada universidade de língua alemã importante e os
jovens afluíam a Königsberg como à Meca da Filosofia. Em alguns casos o governo
prussiano até pagava- lhes as despesas. Kant passou a
ser consultado como um oráculo em todo tipo de questão, inclusive em assuntos
como a legalidade da vacinação.
As muitas homenagens não interromperam os hábitos regulares
de Kant, que seguiu sempre sua rotina de trabalho e
investigação filosófica sobre a vasta gama de tópicos que se pode ver na lista
de seus trabalhos. Com pouco mais de 1,50 m de altura, com o peito
deformado e sofrendo de saúde precária, Kant manteve
através da sua vida um severo regime. Era um sistema cumprido com tal
regularidade que as pessoas diziam poder acertar os relógios de acordo com sua
caminhada diária ao longo da rua que depois recebeu o nome, em sua homenagem,
de "Caminhada do Filósofo". Até que a idade o impediu, sabe-se que
ele somente perdeu sua aparição regular na ocasião em que o "Emile",
de Rousseau o fascinou tanto que, por vários dias, ele ficou em casa.
Após um declínio gradual que foi muito doloroso para seus
amigos tanto quanto para ele próprio, Kant morreu em
Königsberg em 12 de fevereiro de 1804. Suas últimas palavras foram "isto é
bom".
Filosofia de Kant
Durante o período de sua carreira acadêmica, estendendo de 1747
a 1781, como professor Kant seguiu a filosofia
então prevalecente na Alemanha, que era a forma modificada do racionalismo
dogmático de Wolff com fundamento em Leibniz. Porém, as aparentes
contradições que ele descobriu nas ciências físicas, e as conclusões a que Hume
havia chegado na sua análise do princípio de causa, dizendo que a relação de
causa e efeito é uma questão de hábito e não uma "verdade de razão"
como supunha Leibniz, acordaram-no para a necessidade de revisão ou criticismo
de toda experiência humana do conhecimento, com o propósito de permitir um grau
de certeza para as ciências físicas, e também para o propósito de colocar sobre
uma fundação sólida as verdades metafísicas que o ceticismo fenomenalista de
Hume tinha destruído.
Kant achou que o velho racionalismo
dogmático havia dado muita ênfase aos elementos a priori do conhecimento e que,
por outro lado, a filosofia empírica de Hume tinha ido muito longe quando
reduziu todo conhecimento a elementos empíricos ou a posteriori. Portanto, ele
se propõe passar o conhecimento em revista, na ordem a determinar quanto dele deve
ser consignado aos fatores a priori ou estritamente racionais, e quanto aos
fatores a posteri resultantes da experiência. Ele mesmo afirmava que o negócio
da filosofia é responder a três questões:
1. que eu sei?
2. que devo fazer?
3. que devo esperar?
No entanto, as respostas para a segunda e terceira perguntas
dependem da resposta para a primeira: nosso dever e nosso destino podem ser
determinados somente depois de um profundo estudo do conhecimento humano.
Metafísica
O problema fundamental de toda a metafísica é a questão
"que é que existe?" E quanto a essa questão fundamental, as
principais correntes que, no final do século XVIII Kant se
propõe a conciliar, são o realismo e o seu oposto o idealismo, o racionalismo e
o seu oposto o empirismo.
O REALISMO sustenta que, no conhecimento humano, os objetos
do conhecimento são intuídos, apreendidos e vistos como eles realmente são em
sua existência fora e independente da mente. Então, conhecer uma coisa
significa encontrar entre os conceitos possíveis, aquele que está adequado a
essa coisa (a essência). Se a isso acrescentamos os caracteres acidentais
individuais da substância, então chegamos ao conhecimento pleno da realidade.
O IDEALISMO, ao contrário, sustenta que as coisas existem
conforme a mente pode construí-las; tudo que existe é conhecido para o homem
nas dimensões que lhe são mentais, como idéias ou através de idéias. O
idealismo metafísico sustenta a idealidade da realidade, e o idealismo
epistemológico sustenta que, no processo do conhecimento, os objetos da mente
estão condicionados pela sua perceptibilidade.
O RACIONALISMO tem a razão como suprema fonte e teste do
conhecimento, sustentando que a realidade, ela mesma, tem uma estrutura lógica
inerente; para o racionalismo existe uma classe de verdades que o intelecto
pode intuir diretamente, além do alcance da percepção sensível.
Ao racionalismo opõe-se o EMPIRISMO, que sustenta que todo
conhecimento vem, e precisa ser testado, pela experiência sensível.
Já se vê que essa última corrente, a do EMPIRISMO, tende a
negar a Metafísica, porque esta trata das possibilidades de intuição do
conhecimento, para além das coisas apreendidas pelos sentidos, para além da
experiência.
A filosofia de Kant vai tocar em
todas essas correntes, como veremos abaixo. E para tentar compreende-la vamos
necessitar primeiro aclarar uma complicada nomenclatura que classifica as
proposições ou juízos; não será possível compreender o pensamento deKant sem
conhecermos bem sua nomenclatura, porque o que Kant faz
de importante é precisamente renomear e reclassificar certos conceitos
relativos às proposições metafísicas mediante uma visão e uma teoria
inteiramente novas do conhecimento.
Proposições ou juízos
Toda proposição ou juízo consiste num sujeito lógico do qual
se diz algo, é de fato um predicado, aquilo que se diz desse sujeito. Kant,
como os filósofos aristotélicos, diferenciava modos de pensar, ou seja, as
proposições ou juízos, em analíticos e sintéticos.
1. - Os juízos analíticos, são o resultado de se tomar parte
do sujeito como predicado, sem referência imediata a experiência. Leibniz os
chamou "Verdades de razão"; todos os juízos analíticos são a priori,
porque a ligação, o nexo, neles é percebido sem apelo à experiência. Para saber
mais veja Outros temas em Kant.
Os juízos analíticos são sempre verdadeiros, visto que não
dizem mais como predicado que aquilo que, de qualquer forma, já está no sujeito
mesmo. Os juízos em questão consistem apenas em um processo de análise; nos
juízos analíticos, dentro do conceito do sujeito tem que estar os seus próprios
predicados. Uma proposição analítica é uma na qual o predicado está contido no
sujeito como na afirmação: "A casa verde é casa". São universais, porque
o que dizem é independente de tempo e lugar, e são necessários porque não podem
ser de outro modo; distinguem-se do conhecimento empírico pela universalidade e
necessidade. São, pois, como dito acima, a priori, "sem apelo à
experiência", portanto são razão pura e que não tem origem na experiência.
Conforme o exemplo, uma casa é uma casa, mesmo que não exista nenhuma casa no
mundo.
Kant usa indiferentemente o termo "a
priori" e o termo "puro". Razão pura é o mesmo que razão a
priori; intuição pura é intuição a priori. Puro e a priori ou independente da
experiência são expressões que ele utiliza como sinônimos. A verdade, neste
tipo de proposição, é evidente, porque afirmar o inverso seria fazer a
proposição contraditória. Tais proposições são chamadas analíticas porque a
verdade é descoberta pela análise do próprio conceito, sem necessidade de
constatação empírica ou pelos sentidos humanos.
A filosofia de Leibniz, que Kant conhece
através de Christian Wolff, estava baseada no princípio supremo da
não-contradição. Qualquer conceito que contenha uma contradição não expressa a
possibilidade e por isso não pode expressar a realidade. Por isso a proposição
analítica é a verdadeira, porque diz algo necessário, inescapável (universal),
de que não se pode fugir de admitir, conclusão obrigatória, contra o que não se
pode levantar uma contradição.
Mas o juízo analítico torna-se um juízo óbvio. Kant diz
que o juízo analítico não faz avançar o conhecimento porque fica dentro dos
conceitos da mesma proposição, e nada avança além dos dados desses conceitos. O
juízo analítico está fundado no princípio de identidade e não é mais do que uma
tautologia; repete no predicado aquilo que já está enunciado no sujeito.
2. - Os juízos sintéticos, diferentemente, são aqueles em
que não se pode chegar à verdade por pura análise de suas proposições. Os
juízos sintéticos, as proposições sintéticas, são resultado de se juntar
(síntese) os fatos, ou dados, da experiência. Ainda de acordo com os
aristotélicos, todos os juízos sintéticos são a posteriori (depois da
contatação), porque eles são dependentes da experiência.
As proposições ou juízos sintéticos unem o conceito expresso
pelo predicado ao conceito do sujeito que constata, e acaba por informa alguma
coisa de novo. Na proposição "A casa é verde", preciso ver a casa
para confirmar que é, de fato, verde. Os juízos sintéticos são feitos com
fundamento na experiência, na percepção sensível. Nos juízos sintéticos, o
conceito do predicado não está contido no conceito do sujeito. Como, por exemplo,
quando dizemos que as ondas eletromagnéticas produzem em nós a sensação do
calor e igualmente dilatam os corpos. Todas as proposições resultantes da
experiência do mundo são sintéticas.
Leibniz e Hume
Esclarecida essa nomenclatura, precisamos tocar de leve o
pensamento de Leibniz e Hume, os dois filósofos envolvidos na questão que Kant queria
elucidar, que era a natureza da verdade científica, se ela podia ser garantida
pela Metafísica como verdade de razão.
Leibniz deu à Metafísica um par de primeiros princípios que
garantiriam os juízos analíticos que, como visto, são a priori, são
"verdades de razão", absolutamente incontestáveis. Leibniz os chamava
o "princípio de contradição" e o "princípio de razão" ou
"causa suficiente".
Leibniz construiu esses princípios para estabelecer o que é
possível e o que é impossível. Leibniz sustentava que esses princípios são
sabidos se sustentarem, eles próprios, a priori (independentemente da
experiência) e Wolff, seu discípulo, até mesmo tentou fazer derivar o princípio
de razão suficiente do princípio de não contradição.
Conquanto o princípio de não contradição seja de aceitação
fácil, já o princípio de causa suficiente logo suscitou dúvidas, e
principalmente a David Hume. Esse princípio estabelece que cada fato existente
ou verdadeiro tem uma causa, uma razão que o constitui e impede as coisas de
serem de outro modo. E Hume vem a contestar que uma proposição pudesse ser
analítica, - a priori, absolutamente incontestável -, simplesmente por via de
uma razão ou causa suficiente. Isto porque, a relação de causa e efeito para
ele representava experiência, hábito em ver causa e efeito em tudo o que
acontece, e não seria "razão", ligação inconteste entre um sujeito e
um predicado como requerem as proposições analíticas.
Diz Hume "Quando observamos os objetos ao nosso
redor, e consideramos a operação de causa, nunca podemos, em um único caso,
descobrir qualquer poder ou conexão necessária; qualquer qualidade que ligue o
efeito a causa, e torne uma a consequência infalível da outra. Nós apenas
verificamos que uma, na verdade, de fato, segue-se à outra" (Enquiry,
Section VII, Part I). A conexão é feita por um ato da mente "Quando
dizemos, portanto, que um objeto está ligado a outro, queremos apenas dizer que
ele adquiriu uma conexão em nosso pensamento, e isto parece fundado em
evidencia suficiente" (Idem, Part II).
Então, segundo Hume, esse princípio da causa eficiente não
podia dar proposições analíticas como deveriam ser os princípios metafísicos,
quer dizer, não se podia inferir diretamente de um fato a sua causa, de modo a
priori, com o uso exclusivo da razão, como nas proposições analíticas, nas
quais o predicado já está contido no sujeito, - como no exemplo acima "A
casa verde é casa"- , extraindo-a do próprio enunciado. Era preciso
juntar, sintetizar fatos da experiência, o que transformava a proposição em
sintética, em verdade a posteriori, o que quer dizer que ela incorporava outros
fatos para formar o predicado, e então não podia ser um princípio metafísico,
uma verdade validada pela razão. A proposição sintética por si não garante
verdade.
Kant, professor de Metafísica, estava diante
de um problema. Era evidente que as verdades da experiência não eram menos verdade
só porque derivavam da experiência. Elas eram a posteriori a primeira vez, mas
de algum modo se tornavam a priori no sentido de que, independentemente de
novas experiências, a razão já lhes dava um tratamento a priori como verdades.
Apesar de sintéticas, eram a priori, como se houvessem se tornado, de
sintéticas, em analíticas. Por isso era necessário achar um modo para
que tais proposições pudessem ser parte da metafísica.
Juízos sintéticos a priori
Ao mesmo tempo que os juízos sintéticos são tomados como
base do conhecimento científico, o qual se baseia na observação, eles se tornam
leis que pretendem ser verdadeiras todo o tempo, e universais. Portanto, tais
juízos teriam que ser conhecimento sintético a priori, porque, uma vez suas
leis estabelecidas pela observação, passam a ser universais e independentes da
experiência. Efetivamente, Newton havia demonstrado, na Física, a possibilidade
de reduzir a fórmulas matematicamente exatas as leis fundamentais da natureza.
A ciência está, portanto, constituída por juízos a priori que são sintéticos e
não analíticos.
Intuição sensível
A arrojada tese de Kant na
"Crítica da Razão Pura" é que é possível fazer juízos sintéticos a
priori. Essa posição filosófica é usualmente conhecida como transcendentalismo.
Mas para isso ele introduz um conceito novo na metafísica: o de intuição
sensível.
A intuição sensível é a condição para que o ato do
conhecimento se faça segundo juízos sintéticos que são também a priori, apesar
de obtidos fora da análise conceitual própria da razão pura, uma vez que
resultam da intuição exercida sobre a observação e a experiência, e somente
poderiam ser particulares e momentâneos. Mas, abrindo na razão esse
comportamento da intuição sensível, Kant podia agora
fazer importantes correções.
O que era preciso corrigir na metafísica
A metafísica vinha considerando intuição de racionalidade
apenas a intuição de causa e efeito, de causa suficiente, para validar as
verdades de razão, quando existiam outras formas de intuição que podiam garantir
também verdades de razão. A correção indispensável é que era preciso admitir
todas as formas de intuição racionais, não apenas a de relação de causa e
efeito, mas também a de quantidade, a de qualidade, e a de modalidade, e por
meio de todas elas, é claro, o espírito intuia verdades de razão.
Em geral, Kant acredita que a tarefa
de mostrar como juízos sintéticos podem ser feitos a priori é a primeira tarefa
da Metafísica. Ele sustentou que os grandes metafísicos do passado falharam em
fazer isto. Intuição intelectual é uma ficção. Nenhuma inferência além da experiência,
na intuição intelectual, se justifica. Análises de conceitos não irão produzir
verdades além de puras tautologias, quando o que conduz a um conhecimento novo
são as verdades sintéticas, por via da intuição sensível.
O que era preciso corrigir em Leibniz
Leibniz corretamente construiu o princípio da "causa
suficiente" como a priori, mas classificou-o erradamente como analítico.
Se estava numa relação causal, o juízo era sintético, não podia ser analítico.
Mas, ressalvado que era sintético, continuaria a ser a priori como queria
Leibniz, pois o princípio de "causa suficiente" referia-se a uma
forma de intuição e toda intuição é um conhecimento a priori.
O que era preciso corrigir em Hume: Hume corretamente
construiu o juízo causal como sintético mas, incorretamente, concluiu que por
isso ele era exclusivamente empírico, a posteriori, não correspondia a verdades
de razão, como queria Leibniz (que o havia tomado erradamente como analítico).
Ora, corrigido que o juízo causal não era analítico, como havia pretendido
Leibniz, mas sintético, intuído da experiência, era também verdade de razão,
era intuição, por isso gerava conhecimento a priori, necessário, do mesmo modo
que os conhecimentos a priori intuídos das proposições analíticas.
O espaço e o tempo
Revirando na mente a questão das intuições, Kant foi
descobrindo mais coisas. O espaço e o tempo eram duas formas fundamentais de
sensibilidade, formas indispensáveis à intuição sensível. E disse o que
chocaria muita gente não fosse dito por ele, Kant, que as
proposições ou juízos matemáticos eram sintéticos, porque dependiam dessas
formas fundamentais, e, no entanto, estava convencido de que eram verdades
necessárias.
A solução de Kant então é essa, que
o conhecimento sintético depende de formas de sensibilidade e intelecção
previamente existentes na qual as impressões são colocadas. É porque possui o
espaço como uma estrutura inerente à sua sensibilidade que o sujeito
cognoscente pode perceber os objetos como relacionados espacialmente. Pode-se
pensar o espaço sem coisas, mas não as coisas sem o espaço.
Para a geometria, o espaço puro é o primeiro suposto. A
geometria supõe o espaço sob os seus conceitos de polígonos. Ex: "A
linha reta é a distância mais curta entre dois pontos" (qualquer linha
reta = universalidade; em quaisquer condições = necessidade). Embora não tenha
em si o princípio de não contradição e dependa da intuição de espaço e portanto
é sintética, essa firmação é conhecimento puro ou a priori porque a intuição do
espaço está na mente. Uma vez concebida, não depende mais da experiência
sensível. É verdade de razão, distinguindo-se do empírico pela universalidade e
necessidade.
O que foi esquecido, contesta Kant (em
um rodapé no Apêndice de seu livro "Prolegomena a qualquer futura
Metafísica"), é que há um tipo de conhecimento a priori associado com os
sentidos. Em particular, as verdades matemáticas são conhecidas porque espaço e
tempo são "formas de intuição sensível". Eles são pré-requisitos
absolutos para a representação de objetos sensíveis; qualquer objeto da
experiência precisa ser representado em espaço e tempo. A Geometria é a ciência
do espaço e a aritmética a ciência do tempo, e suas proposições são verdades
necessárias relativas aos objetos no espaço e no tempo. Em fim, nós
raciocinamos sobre as condições de representação, e a intuição intelectual
torna-se dispensável.
No entanto, fora do espaço e do tempo elas não são
absolutamente necessárias. Para que fossem, seu oposto precisava implicar a contradição.
Mas Kant reconhece a consistência de geometrias
alternativas, que podem implicar proposições contrárias. Assim, uma proposição
pode ser verdade em uma e falsa em outra (p. ex. a soma dos ângulos de um
triângulo é 180 graus, o que é verdade na geometria euclidiana mas falsa nas
geometrias não euclidianas).
De outro lado, Kant reconheceu o
princípio da razão suficiente (para coisas no tempo: cada alteração de uma
coisa tem uma causa) como uma verdade necessária. Kant alegou
que os princípios da matemática são necessários enquanto forem condições da
representação sensível. Podemos agora dizer que eles são sintéticos, quanto a
que seu oposto não implica uma contradição. Princípios de "ciência natural
pura" tal como o princípio causal acabado de ser mencionado, são também
sintéticos e conhecido a priori. Eles são condições para a coerência ou
"unidade" da experiência. São necessários para que nós sejamos
capazes de representar um mundo de objetos como pertencentes a uma única
experiência.
O espaço é intuição pura, a priori. É um subposto que o
homem coloca à sua experiência com os objetos, mas é absolutamente independente
da experiência; não podemos ter experiência de nada senão no espaço. O espaço
não deriva da experiência e também não é um conceito. O conceito compreende uma
multiplicidade. O conceito de homem, por exemplo, é a unidade mental sintética
daqueles caracteres que definem todos os homens. Ao contrário do conceito, a
intuição toma conhecimento diretamente de uma individualidade: o espaço é
único; é intuição pura.
Igualmente, é porque a representação do tempo lhes serve de
fundamento que a simultaneidade ou sucessão das coisas pode ser percebida; as
coisas e os fatos não existem sem o tempo, mas o tempo existe sem as coisas.
Também o tempo é a priori, ou seja, independente da experiência. Algo acontece
porque no decurso do tempo esse algo vem a ser. Podemos conceber o tempo sem
acontecimentos, mas não um acon tecimento sem o tempo.
O tempo também não é conceito, porque não existem muitos tempos:
o tempo, como o espaço, é intuição.
Em sua filosofia, Kant reformula o
racionalismo, ao demonstrar que o conhecimento a priori, próprio da razão pura,
pode originar-se também da experiência, e isto porque a experiência envolve
elementos que são intuições puras, a priori, e estas são principalmente as
intuições de espaço e tempo.
Dá um golpe mortal no realismo ao olhar o mundo material
como fruto da intuição sensível. Os objetos do mundo material são
fundamentalmente incognocíveis: do ponto de vista da razão eles servem
meramente como a matéria prima da qual as sensações são formadas. Os objetos
eles mesmos não tem existência, e o espaço e o tempo existem somente como
partes da mente, como "intuições" pelas quais as percepções são medidas
e julgadas.
Importância relativa entre espaço e tempo. O Espaço e tempo
são "subpostos" como condições de conhecimento, condições que,
partindo do sujeito, precisam realizar-se para que o objeto seja efetivamente
objeto do conhecimento. Esses subpostos Kant chama
"condições transcendentais da objetividade". Espaço e tempo seriam,
assim, duas condições sem as quais é impossível conhecer, mas são formas de
sensibilidade, por issoKant os trata na Estética
Transcendental.
O espaço é a forma da experiência ou percepções externas; o
tempo é a forma das vivências ou percepções internas. Porém, ao mesmo tempo que
eu percebo a coisa sensível, tenho, além de sua percepção como coisa externa, a
sua "apercepção" interna, dando-me conta de que a percebo. Por conseguinte,
o tempo tem uma posição privilegiada em relação ao espaço, porque é forma da
sensibilidade externa e interna, com referência a objetos exteriores e a
acontecimentos interiores, abrangendo assim a totalidade das vivências
possíveis.
Após elucidar exaustivamente essas intuições básicas,
fundamentais, de espaço e tempo, aquilo que o sujeito põe para a
cognoscibilidade das coisas, dos fenômenos, Kant busca
elucidar também as leis efetivas que regem os fenômenos. As coisas tem seu ser,
sua essência, sua natureza; existem e se relacionam segundo leis fixas de
efeito e causa, ou ação e reação, e estas leis são universais. Portanto, além
das duas formas fundamentais da sensibilidade, espaço e tempo, existem outros
elementos apriorísticos próprios do entendimento, da razão. Estes pertencem à
lógica tradicional, desde Aristóteles (384- 322). Kant trata
deles na "Analítica Transcendental". Esses a priori da lógica Kant diz
que correspondem, na verdade, às formas pelas quais a mente está limitada no
seu conhecimento das coisas, ou seja, não pode conhecer nada senão desse modo.
Aquilo que a lógica dizia que a realidade tem que conter é o
que, segundo Kant, nós temos capacidade para ver na
realidade. A realidade mesma nós desconhecemos. A realidade é o noumenon, a
coisa em si mesma. O que nós podemos conhecer dela, dentro de nossas formas
possíveis de conhecimento, é o fenômeno. Este conhecimento a respeito das
coisas é a priori, não se constitui de impressões. Nenhuma coisa nos envia
"a causa" como impressão. Extraímos o conhecimento de causa não do
real, mas de nosso próprio pensamento. Fazemos um "juízo" a respeito
da causa.
Algo é real quando é objeto possível de juízos, de
afirmações ou de negações. Então não basta que revistamos de espaço e tempo a
determinado algo para que seja real, mas é necessário que possamos fazer dele
juízos, dizer que "é" isto ou "é" aquilo. Se a realidade se
apresenta nos juízos, então às diferentes formas dos juízos corresponderão
diferentes variedades em que se pode apresentar a realidade. O homem formou,
assim, um conjunto de juízos ou teses, que expressam aquilo que as coisas reais
são.
As diferentes formas de juízo, na lógica formal, são:
1. juízos de quantidade,
2. juízos de qualidade,
3. juízos de relação e
4. juízos de modalidade.
À aquelas diferentes variedades em que se pode apresentar a
realidade em correspondência aos juízos Kant chama
"categorias". Como o espaço e o tempo são as condições da
possibilidade dos juízos sintéticos a priori na matemática, as categorias são
as condições da possibilidade dos juízos sintéticos a priori na Física. São
categorias de sintetização dos dados da experiência, são também formas de
intuição. Ele dividiu as categorias em quatro grupos: aqueles referentes aos
juízos lógicos, segundo a quantidade, qualidade, relação e modalidade:
Quantidade: unidade, pluralidade e totalidade; dão os juízos
individuais: João é espanhol; particulares: alguns homens são brancos;
universais: todo homem é mortal. Desta maneira, quanto à quantidade, os juízos
individuais (Este A é B) que afirmam de uma coisa única, contêm no seu seio a
unidade; os juízos particulares (Alguns A são B), que afirmam de várias coisas
algo, contêm implícita a pluralidade; os juízos universais (Todo A é B) contêm
a totalidade. De modo que as três formas de juízos, segundo a quantidade, dão
lugar a estas três categorias: unidade, pluralidade e totalidade.
Qualidade: realidade, negação, e limitação; dão os juízos
afirmativos: João é espanhol; negativos: o átomo não é simples; infinitos: os pássaros
não são mamíferos (podem ser infinitas coisas). Do ponto de vista da qualidade,
os juízos são: afirmativos (A é B), negativos (Entre B e C, A não é B), e
infinitos (A não é B). Deles Kant extrai as três
categorias de essência (que ele chama realidade), de negação e de limitação (o
juízo infinito contem limitações, diz aquilo que algo não é, mas deixa aberto
um campo infinito para o que possa ser). As categorias desse grupo são as de
essência, negação e limitação
Relação: substância-e-acidente, causa-e-efeito; dão os
juízos categóricos: o ar é pesado; hipotético: se João é espanhol, então é
europeu; disjuntivo: Antônio é espanhol, ou português, ou italiano. Assim, os
juízos segundo a relação são categóricos (A é B), hipotéticos (Se A é B, é
também C) e disjuntivos (A é B, ou C, ou D). Resultam as três categorias
seguintes: dos juízos categóricos (A é B), a categoria de substância com o seu
complemento natural de "propriedade" porque quando afirmo
categoricamente que uma coisa "é isto", considero esta coisa como uma
substância; "é isto" que dela afirmo como uma propriedade dessa
substância. Dos juízos hipotéticos resultam a categoria de causalidade (de
causa e efeito), porque, quando formulamos um juízo como "Se A é B, é
também C, já assentamos o esquema lógico da causalidade (Se faz calor, se
dilatam os corpos). Dos juízos disjuntivos extrai Kant a
categoria de ação recíproca. Neste grupo estão as categorias de propriedade,
causalidade, e ação recíproca.
Modalidade: possibilidade, existência e necessidade; dão os
juízos problemáticos: A pode ser B; assertórios: A é B (mas não haveria
contradição se A fosse C como "O calor dilata os corpos", pois é
assim, mas poderia ser diferente; apodíticos: A é necessariamente B como a soma
dos ângulos de um triângulo tem que ser dois retos". Desta quarta maneira
de dividir os juízos procedem então as seguintes categorias: dos juízos
problemáticos (A pode ser B) Kant extrai a categoria de
possibilidade; dos juízos assertórios (A é efetivamente B), faz derivar a
categoria de existência; dos juízos apodíticos (A tem que ser B), tira a
categoria de necessidade. Aqui são as categorias de possibilidade, existência e
necessidade. Temos então completa a tabela das categorias. São doze as
categorias deKant.
Se tudo aquilo que há na ciência, se todas as condições do
conhecimento tivessem que nos ser proporcionadas pelas impressões sensíveis que
as coisas nos enviam, então Hume teria razão: esperaríamos que o sol saísse
amanhã pelo simples costume de tê-lo visto sair até agora, mas não por um
fundamento real. Não teríamos intuição de nenhuma ilação, nenhuma vinculação
entre as impressões.
Tudo aquilo que as categorias nos dizem (que os objetos são
únicos, múltiplos, que podem agrupar-se em totalidades, que os objetos são
substâncias com propriedades, causas com efeitos, efeitos com causas, que têm
entre si ações e reações) todas essas categorias são condições sem as quais não
haveria conhecimento. É nossa possibilidade de raciocínio lógico conforme a
essas formas categóricas a priori que procedem de nós que possibilita para nós
o conhecimento e a certeza. As condições do conhecimento, as categorias, são,
por conseguinte, conceitos puros, a priori, que o sujeito cognoscente dá ao
objeto.
Falamos de coisas extensas no espaço e sucessivas no tempo:
o espaço e o tempo não são propriedades absolutas das coisas; o observador as
coloca nas coisas como ele as conhece. Resulta que não tem sentido, então,
falar de conhecer as coisas "em si mesmas". Kant chama
fenômenos às coisas providas das formas de espaço e tempo, vistas na correlação
objeto-sujeito, por via da intuição de tempo e espaço.
A sua posição ou concepção do processo de conhecimento Kant chama
"estética transcendental
". A palavra estética não tem no caso o sentido de
teoria do belo mas sim, o seu sentido etimológico que é sensação, percepção. A
palavra transcendental é usada por Kant no sentido de
condição para que algo seja objeto do conhecimento.
Kant recusou ser idealista e a associação
de sua filosofia com a de George Berkeley. É importante apontar aqui qual
parece ser a diferença. No "Prolegomena a qualquer futura Metafísica" Kant argumenta
que todos aceitavam o ponto de vista antigo de que cores, sons, etc., eram
qualidades que não estão nos corpos, mas são apenas os modos como o
representamos através dos sentidos. Se essa consideração com respeito a
qualidades secundárias (cores, sons, etc.) não exclui a existência dos corpos
em si, porque deveria faze-lo um tratamento semelhante das qualidades primárias
(fenômeno)? Em outras palavras, mesmo que também as qualidades primárias sejam
irreais com respeito aos corpos em si, ou seja, mesmo que essas qualidades
primárias sejam atributos do sujeito e não do objeto, os corpos existem. Realmente, Kant nunca
negou a existência dos corpos, como Berkeley. Apenas nega que eles tenham,
neles mesmos toda representação humana possível, propriedades espaciais e
temporais.
Berkeley nega que fique alguma coisa, se tiramos do objeto
todas as suas qualidades, tanto as primárias como as secundárias,
considerando-as produto de nossos sentidos. Para Berkeley, se também as
qualidades primárias dependem da mente, então não podemos atribuir aos corpos
mesmos a atividade de causar sensações em nós. Então, para Berkeley, é
Deus que causa em nós as impressões.
Mas Kant sustenta que algum material
é causa da intuição sensível. Acredita inteiramente que os corpos existem sem
nós, ou seja, existem coisas as quais, apesar de inteiramente desconhecidas
para nós quanto ao que sejam em si mesmas, sabemos, no entanto, que existem,
pela representação em nossa sensibilidade, e às quais chamamos corpos
("Prolegomena", Primeira Parte, II).
Porque "revolução copernicana".
Com este trabalho Kant orgulhosamente
afirmou que ele havia conseguido realizar a revolução copernicana na filosofia.
Como já referido, Kant disse que, assim como Nicolau
Copérnico, o fundador da astronomia moderna, havia explicado o movimento
aparente das estrelas, vinculando-o parcialmente ao movimento do observador,
assim ele tinha percebido as aplicações dos princípios a priori da mente aos
objetos, pela demonstração de que os objetos se conformam à mente: no
conhecimento não é a mente que se conforma às coisas, mas as coisas que se
conformam à mente.
A Psicologia Racional
A mais séria questão "que é que existe?", problema
fundamental de toda a metafísica, é com respeito ao próprio espírito, ao
universo e Deus. A disciplina metafísica que tem como objeto a alma e sua
imortalidade é a Psicologia Racional. Kant diz que essa
disciplina repousa, desde Descartes, na proposição "eu penso", cuja
verdade é incontestável.
Não se pode, contudo, tirar dessa proposição a consequência
de que o eu exista como um "objeto real" como uma coisa, uma
substância, uma figura. Isto apenas seria possível se passasse pelo crivo das
categorias, ou modo de conhecimento do real. O tempo, juntamente com o espaço,
é a primeira das condições de todo conhecimento possível. Em outras palavras,
não há coisa alguma no espaço e no tempo que possa ser considerado alma, não
havendo, portanto, nenhuma intuição sensível, e esta é uma das condições
fundamentais do conhecimento das coisas.
Conclusão: a experiência que temos de ser (experiência que
se realiza enquanto pensamos), é de fato uma experiência sui generis. Se
quisermos "imaginar" a alma, podemos perfeitamente imagina-la,
pensa-la, dentro da intuição de espaço e tempo, como uma coisa, e então
verificamos que desse modo a alma não existe. Então temos a experiência de ser
(ao modo de Descartes), sem poder fazer idéia do que somos (ao modo de Kant).
Cosmologia racional
A parte da metafísica que se ocupa da totalidade do universo
é a Cosmologia Racional. O que se aplica às almas, aplica-se também à idéia do
universo. As intuições e as categorias podem ser aplicadas para fazer
julgamentos a cerca de experiências e percepções, mas não podem, de acordo com Kant,
ser aplicadas a idéias abstratas, - e universo é uma idéia abstrata, - sem
levar a inconsistências sob forma de pares de proposições contraditórias,
impasses que ele chama "antinomias", raciocínios sem saída,
inconclusivos.
A primeira antinomia é aquela que tem a Tese: "O
universo tem um princípio no tempo e limites no espaço".
Antítese: "O universo é infinito no tempo e no espaço".
A razão tanto pode concluir que "o universo tem um princípio no tempo e
limites no espaço, quanto pode afirmar exatamente o contrário: o universo é
infinito no tempo e no espaço." A razão pede que tudo que existe tenha um
começo. Mas, se o universo teve um começo no tempo, o que existia antes dele,
obviamente também faz parte do universo, porque o universo é a totalidade das
coisas.
Na segunda antinomia, a Tese diz: "Tudo quanto existe
no universo está composto de elementos simples, indivisíveis". A Antítese
diz: "Aquilo que existe no universo não está composto de elementos
simples, mas de elementos infinitamente divisíveis".
A terceira antinomia refere-se a uma primeira causa do
universo. Afirma, como Tese: "O universo deve ter tido uma causa que não
foi por sua vez causada". Sua Antítese é: "O universo não pode ter
tido uma causa que por sua vez não tenha sido causada". A quarta e última
antinomia refere-se à existência ou não existência de um ser necessário, dentro
ou fora do universo, e diz, na Tese: "Nem no universo nem fora dele pode
haver um ser necessário"; sua Antítese: "No universo ou fora dele há
de haver um ser que seja necessário".
Os erros das antinomias
As teses e antíteses são igualmente plausíveis aos olhos da
pura razão, mas não quanto às leis do conhecimento. Nas duas primeiras
antinomias, que Kant chama matemáticas, o erro consiste
em que o tempo e o espaço foram tomados como coisas em si mesmas, e isto é
contrário às leis e condições do conhecimento. O espaço e o tempo não são
coisas em si mesmas, independentes do ato de conhecer.
Nas duas últimas antinomias, a solução para Kant é
a contrária. As teses e as antíteses são tomadas conforme as leis do
conhecimento.
Quanto às teses, as leis do conhecimento de fato pedem que,
para todo ser, para toda realidade, exista uma causa determinante e esta, por
sua vez, tenha uma outra causa e assim sucessivamente; as teses são válidas no
mundo dos fenômenos. Quanto às antíteses, as antíteses seriam válidas no mundo
dos noumenos. Suponhamos que exista uma via para se chegar às coisas
metafísicas que não seja aquela do conhecimento científico: então elas seriam
válidas. As teses são válidas para a ciência fisico-matemática, e as antíteses
seriam válidas para uma atividade não cognoscitiva que nos pudesse conduzir às
realidades metafísicas.
Teologia racional
Em sua crítica à teologia racional, Kant analisa
as provas da existência de Deus mais conhecidas. Estas são o argumento
ontológico; o argumento cosmológico que vem da antigüidade, e o argumento
físico-teleológico. O argumento ontológico, encontrado em Santo Anselmo (1033-1109)
e em Descartes, afirma que o homem tem idéia de um ser perfeito, que
necessariamente deve existir porque se não existisse não seria perfeito.
"Eu tenho a idéia de um ser, de um ente perfeito; este ente perfeito tem
que existir, porque se não existisse, faltar-lhe-ia a perfeição da existência e
não seria perfeito". Kant mostra que a
"existência" é uma das categorias a priori do conhecimento.
A existência é uma categoria aplicável às percepções
sensíveis e portanto só é valida quando aplicada a objetos do conhecimento: o
que é conhecido primeiro existe, a coisa é conhecida como existente, e não o
contrário, isto é, existe porque imaginado. Aplicar as categorias de
existência, de substância, de causa, é o ato pelo qual estabelecemos os objetos
a conhecer, os fenômenos. Não é suficiente ter a idéia de algo, há de se ter a
percepção sensível correspondente, tê-la ou poder tê-la, e é isso justamente o
que falta à idéia de Deus, a coisa à qual se aplique a categoria da existência.
O argumento cosmológico consiste na enumeração de causas dos
fenômenos até se chegar a uma causa não causada, que seria Deus. Kant contra-argumenta
que não há motivo algum para se cessar a aplicação da categoria de causalidade.
O argumento cosmológico é inaceitável porque consiste em ir enumerando séries
de causas até deter-se numa causa incausada, sem motivo algum.
O argumento físico-teleológico é de que todos os seres da
natureza cumprem algum fim, servem para alguma coisa, logo deve haver um
"fim último": Deus. O argumento físico-teleológico é o argumento da
finalidade: só uma inteligência criadora poderia ter adequado as coisas à
realização de certas finalidades. Kant diz que a
teleologia é um método empregado para descrever a realidade e que, de um
simples método de organizar o conhecimento não se pode extrair qualquer outra
conseqüência. Argumenta que, do conceito de fins, não podemos tirar nenhuma
outra conseqüência senão que tal ou qual forma é adequada a um fim.
Mas Deus deve existir
Kant afirma que deve haver um mundo no
qual a virtude traz seguramente a felicidade. "A existência de Deus...é
necessária enquanto afirma um ser cuja vontade e cujo intelecto criam um mundo
no qual não há abismo algum entre o real e o ideal, entre o que é e o que deve
ser".
Há pois um abismo entre a consciência moral, que tem
exigências ideais, e a realidade fenomênica, a qual é cega para essas
exigências ideais, segue seu curso natural de causas e efeitos sem se preocupar
em nada com a realização desses valores morais. Portanto, é absolutamente
necessário que, após este mundo, num lugar metafísico além da presente
realidade, esteja realizada esta plena conformidade entre aquilo que é no
sentido de realidade e aquilo que deve ser no sentido da consciência moral.
Esse acordo entre aquilo que é e aquilo que deve ser, que
não se dá na nossa vida fenomênica, onde predomina a causalidade física e
natural, é um postulado que exige uma unidade sintética superior. A unidade
sintetizadora desse "ser" com o "dever ser", representando
a união do mais real que pode haver com o mais ideal que pode existir,Kant chama
Deus.
A Razão Prática tem a primazia sobre a razão pura, no
sentido de que a razão prática, a consciência moral, pode lograr aquilo que a
razão teórica não logra, conduzindo-nos às verdades da metafísica. A razão
teórica está, de certo modo, ao serviço da razão prática, porque a razão
teórica não tem por função mais que o conhecimento deste mundo real,
subordinado, dos fenômenos, que é como um trânsito ou passagem ao mundo essencial
das coisas em si mesmas que são Deus, o reino das almas livres e as vontades
puras.
Ética
O que Kant chama "Razão
Prática" não se refere à razão que determina a essência das coisas, aquilo
que as coisas são, mas sim, aplicada à ação, à prática, à moral. A
"Crítica da Razão Prática" não fala de uma intuição sensível, de
formas de sensibilidade, nem tem, na terminologia de Kant,
uma "Estética Transcendental", porque, enquanto as funções de
conhecimento têm como fundamento a sensibilidade espaço-temporal, a faculdade
prática e a atividade moral opõem-se a toda determinação sensível. O tempo é
uma forma aplicável a fenômenos, aplicável a objetos a conhecer. A alma humana,
a consciência humana moral, a vontade livre, são alheias ao espaço e ao tempo.
O elemento sensível no comportamento moral não pode ser pressuposto mas, ao
contrário, deve ser deduzido da racionalidade pura.
Dever racional
Na "Metafísica da Ética" Kant descreveu
seu sistema ético, baseado numa crença de que a razão é a autoridade final para
a moralidade. A moral não poderia ter fundamento em observação dos costumes, ou
em qualquer fórmula empírica. Sendo despida, portanto, de tudo que seja
empírico, "a moral é concebida como independente de todos os impulsos e
tendências naturais ou sensíveis"... a moral "seria estabelecida pela
razão" como reguladora da ação. Ações de qualquer tipo, ele acreditava,
precisam partir de um sentido de dever ditado pela razão, e nenhuma ação
realizada por interesse ou somente por obediência a lei ou costume pode ser
considerada como moral.
Mandamentos
Kant descreveu duas classes de
mandamentos dados pela razão. Todo ato, no mo mento de iniciar-se aparece à
consciência moral sob a forma de uma dessas duas classes, ou de um desses dois
tipos, de mandamentos que ele chama "imperativos hipotéticos" e
"imperativos categóricos". Ele distingue os imperativos categóricos dos
imperativos hipotéticos do seguinte modo. O imperativo hipotético dita um dado
curso de ação para se chegar a um fim específico; o imperativo categórico dita
o curso da ação que precisa ser seguida devido a sua correção e necessidade.
Imperativo hipotético
Os imperativos hipotéticos estão subordinados a uma
condição: correspondem a ações como meio de evitar tal ou qual castigo, ou para
obter tal ou qual recompensa. Enunciam um mandamento subordinado a determinadas
condições (se queres sarar, toma o remédio), enquanto o imperativo categórico é
inteiramente desvinculado de qualquer condição.
Imperativo categórico
Como é formulado o imperativo categórico? O imperativo
categórico é a base da moralidade e foi colocado por Kant nessas
palavras: "Aja como se a máxima de sua ação fosse para tornar-se pela sua
vontade uma lei natural geral" o que é o mesmo que: "Age de tal
maneira que o motivo que te levou a agir possa ser convertido em lei
universal" ou ainda "Age de maneira que possas querer que o motivo
que te levou a agir seja uma lei universal".
Com respeito aos juízos morais, as coisas não são nem boas
nem más, são indiferentes ao bem e ao mal. Os qualificativos morais não
correspondem, igualmente, àquilo que o homem faz efetivamente, mas sim,
estritamente, àquilo que ele quer fazer. Esta postulação com respeito aos
juízos morais conduz à conclusão de que a única coisa que verdadeiramente pode
ser boa ou má é a vontade humana.
É importante aqui a noção de uma vontade santa a que se
refere Kant. Para uma vontade desse tipo não haveria
distinção entre razão e inclinação. Um ser possuído de uma vontade santa sempre
agiria da forma que devia agir. Não teria, no entanto, o conceito de dever e de
obrigação moral, os quais somente entram quando a razão e o desejo se encontram em
oposição. Então a vida moral é uma luta contínua na qual a moralidade
aparece para o delinqüente potencial na forma de uma lei que exige ser
obedecida por si mesma, uma lei cujos comandos não são lançados por uma
autoridade alheia mas representa a voz da razão, que o sujeito moral pode
reconhecer como sua própria.
Então, para que cumpra integralmente a lei moral, é preciso
que o domínio da vontade livre sobre a vontade psicológica determinada seja
cada vez mais íntegro e completo.Kant chama santo a um homem
que dominou por completo, aqui, na experiência, toda determinação moral oriunda
dos fenômenos concretos, físicos, fisiológicos, psicológicos, para sujeita-la à
lei moral.
Liberdade
A condição preliminar para que seja possível apenas a razão
determinar a ação é a liberdade, o que leva a conceber a liberdade como
postulado necessário da vida moral, ou seja, o seu a priori. O eu se põe como
sujeito cognoscente, ao qual está afeto o processo do conhecimento, e esse
mesmo eu é também consciência moral e refere-se a si mesmo não como sujeito
cognoscente, mas como eu ativo, que tem vontade, como "agente".A vida
moral somente é possível, para Kant, na medida em que a
razão estabeleça, por si só, aquilo que se deva obedecer no terreno da conduta.
As idéias éticas de Kant são um
resultado lógico de sua crença na liberdade fundamental do indivíduo como
afirmada na sua "Crítica da Razão Prática" (1788). Esta liberdade ele
não olhava como a liberdade sem leis da anarquia, mas mais como a liberdade de
autogoverno, a liberdade para obedecer conscientemente as leis do universo como
reveladas pela razão.
A vontade é autônoma quando dá a si mesma sua própria lei; é
heterônoma se recebe passivamente a lei. Se a vontade é autônoma, isto implica
no postulado da liberdade da vontade. Como poderia ser a vontade meritória, boa
ou má, se estivesse sujeita à lei de causas e efeitos, à determinação natural
dos fenômenos?
De outra parte, Kant concebe a
liberdade da vontade de duas maneiras. Considerada como um fenómeno que se
efetua no mundo sensível dos fenômenos, onde cada uma de nossas ações tem suas
causas e está integralmente determinada (Vontade psicológica) a vontade não é
absolutamente livre.
No mundo inteligível manifesta-se a vontade livre, que não
está sob aspectos de causa, de determinação, mas sob o aspecto do dever. Visa a
prática do bem. Este é o efeito possível da liberdade, do ponto de vista moral,
segundo Kant.
Kant faz distinção entre as máximas e as
leis morais. As primeiras, as máximas, seriam subjetivas, contendo uma condição
considerada pelo sujeito como válida somente para sua vontade, condição de
alcançar sua felicidade pessoal, e portanto sua vontade está condicionada. As leis
morais, ao contrário, seriam objetivas, contendo uma condição válida para a
vontade de qualquer ser racional. Ambas derivam puramente da razão, mas apenas
a vontade determinada apenas pela forma da lei e, por consequência independente
de todo estímulo empírico é livre.
Imortalidade
O primeiro postulado com que Kant inaugura
sua metafísica, extraindo-a da ética, é esse postulado da liberdade. O segundo
é o da imortalidade. De onde deduz a imortalidade?
Se a vontade humana é livre, existe um mundo inteligível,
não sujeito às formas de espaço, ao tempo nem às categorias. Se nosso eu, como
pessoa moral, não está sujeito a espaço, tempo e categorias, não tem sentido
para ele falar de uma vida mais ou menos longa, mais ou menos curta. O limite
de tempo deixa de interessar. Essa conclusão simples pela imortalidade vai
abrir caminho para o fundamento da moral. Pois, que motivo teria alguém para
seguir uma lei moral? A resposta só pode ser encontrada admitindo-se a primazia
da razão prática, mediante a fé moral na imortalidade da alma e a existência de
Deus, que ressurgem, assim, no sistema Kantiano, como postulados da "razão
pura prática". A fé moral na imortalidade da alma é necessária para que se
conceba uma vida supra-sensível na qual a virtude possa receber seu prêmio.
Prêmio? Neste ponto existe um impasse, uma antinomia: por
uma lado o desejo de felicidade deve ser a causa motora para a máxima da
virtude ("sede virtuosos para que possais alcançar a felicidade") mas
isto é contrário à pureza exigida pela lei moral (que não admite qualquer
interesse); por outro lado, a virtude deveria ser garantia de felicidade, o
que, neste mundo, não acontece. Então não haveria motivo algum para a
moralidade. Teria que ser um gosto por obedecer a lei em si mesma, sem qualquer
proveito. Poder-se-ia dizer que o respeito pela lei não é apenas um motor da
vontade, mas a própria moralidade, considerada subjetivamente como motivo.
Kant faz distinção entre o bem e o
agradável. O bem independe de todo conteúdo empírico. O bem é função da lei
moral, não deve, pois, ser determinado antes da lei moral, mas só depois dela e
mediante ela.
Política
Em seu tratado "Paz perpétua" Kant advogava
o estabelecimento de uma federação mundial de estados republicanos. Acreditava
que a felicidade de cada indivíduo deveria ser, com propriedade, olhada como um
fim em si mesma e que o mundo progredia na direção de uma sociedade ideal na
qual a razão haveria de "levar cada legislador a fazer suas leis de tal
modo que elas poderiam ter emergido da vontade unida do povo inteiro, e olhar
cada assunto, tanto quanto ele quisesse ser um cidadão, na base de se ele
estava de acordo com essa vontade".
Estética
A Estética é reconhecida como uma disciplina dentro da
filosofia. O termo foi usado por Baumgartem em "Reflexões sobre a
Poesia" e de então tornou-se parte permanente do vocabulário filosófico.
Além de conhecer, e da liberdade de agir conforme o bem ou o
mal, Kant reconhece ainda no homem a faculdade de
julgar. Ele indaga se essa faculdade também possui princípios a priori, ou
seja, formas universais e necessárias de subordinação do mundo natural à razão
ou espírito humano. Constituem a faculdade de julgar dois tipos de juízos: o
determinante e o reflexionante.
O sentimento de prazer e desprazer constitui a fonte do
juízo reflexionante, que concilia a faculdade de conhecer com a faculdade de
desejar, na medida em que subordina um conteúdo representativo (algo conhecido)
a um fim desejado. Os juízos reflexionantes são de dois tipos: os estéticos e
os teleológicos.
A "Crítica do juízo" Kant dividiu-a
em duas partes: A "Crítica do juízo estético" e a "Crítica do
juízo teleológico". Nessa obra, considerada um de seus trabalhos mais
originais e instrutivos, ele analisa, na primeira parte, uma teoria do belo,
compreendendo a faculdade de julgar a finalidade formal, que chama também
finalidade subjetiva, por meio do sentimento de prazer ou desprazer, e na
segunda, a aparência de finalidade na natureza, a faculdade de julgar a
finalidade real, objetiva, da natureza mediante o intelecto e a razão. Na
primeira parte, após uma introdução em que discute "finalidade
lógica", ele analisa os juízos que atribuem beleza a alguma coisa.
O juízo estético tem por objeto o sentimento do belo e do
sublime. Nos juízos estéticos, o objeto é relacionado com um fim subjetivo, ou
seja, com o sentimento de eficácia sentido pelo homem diante desse objeto.
O belo.
Do agradável e do útil Kant diz que
tem como condição "uma correspondência entre o objeto e um interesse
meramente individual e contingente, ou puramente racional". Ao contrário,
no sentimento do belo, não ocorre esse tipo de condicionamento. O que importa
no sentimento do belo é apenas a forma da representação, na qual se realiza a
plena harmonia entre as funções cognoscitiva, sensível e intelectual.
A explicação está no fato de que, quando uma pessoa
contempla um objeto e o acha belo, há uma certa harmonia entre sua imaginação e
seu entendimento, do qual ela fica consciente devido ao imediato deleite que
ela tem no objeto.
Segundo Kant, a harmonia entre as funções
cognoscitiva, sensível e intelectual é inteiramente independente do conteúdo
empírico da representação e dos condicionamentos individuais, e portanto o
sentimento do belo resultante é apriorístico e, como tal, fundamenta a validez
universal e necessária dos juízos estéticos. Tais juízos, de acordo com ele,
diferentemente de mera expressão de gosto, pretendem uma validade geral, mas
não podem nem por isso ser considerados cognitivos porque fundam-se na
sensibilidade, não sobre argumentos.
A imaginação se apodera do objeto e no entanto não está
restrita a nenhum conceito definido; ao mesmo tempo a pessoa pode imputar o deleite
que sente também aos outros porque ele salta do jogo livre de suas faculdades
cognitivas, que são as mesma em todos os homens. Por isso Kant estava
particularmente preocupado com a exigência que as pessoas fazem pela
universalidade do juízo do belo para explicar e sustentar o alto prestígio da
artes. É uma exigência comparável à que é feita pela moralidade que, sem essa
exigência de universalidade, parece que estaria ameaçada de desintegração.
O sublime.
Como sublime Kant entende "um
estado subjetivo determinado por um objeto cuja infinidade se alcança com o
pensamento, mas não se pode captar pela intuição sensível. "O sublime,
tanto quanto o belo, é fonte de sentimento de prazer e é universal".
Juízos teleológicos.
Nos juízos teleológicos, o objeto é considerado segundo as
exigências da razão, como correspondendo a uma finalidade objetiva (se serve
para isto ou aquilo); adaptando-se aquelas exigências, suscita um sentimento de
prazer. Na segunda parte da sua "Crítica do Juízo", Kant voltou
a considerar a finalidade na natureza como ela é colocada pela existência nos
corpos orgânicos de coisas das quais as partes são reciprocamente meios e fins
umas para as outras. Ao tratar com esses corpos, alguém não pode contentar-se
meramente com princípios mecânicos.
No entanto, se o mecanismo é abandonado e a noção de
finalidade ou fim da natureza é tomado literalmente, isto parece implicar que
as coisas às quais se aplica precisam ser o trabalho de um arquiteto
sobrenatural, mas isto significariam uma passagem do sensível para o
supra-sensível, um passo que na sua primeira "Crítica" ele considerou
ser impossível.
Kant responde a essa objeção admitindo
que a linguagem teleológica não pode ser evitada na descrição dos fenômenos
naturais mas ela precisa ser entendida como significando apenas que os
organismos precisam ser considerados "como se" eles tivessem sido o
produto de um projeto, de um designe, o que de modo algum é a mesma coisa que
dizer que eles foram assim deliberadamente produzidos.
Ballone GJ - Kant, in. PsiqWeb, Internet,
disponível em http://linkorigins.blogspot.com.br, revisto em 2005
Estas página são, predominantemente, resumos do artigo Immanuel Kant in.
Filosofia Moderna - Rubem Queiroz Cobra
COBRA.PAGES.nom.br, Internet, Brasília, 1997. Disponível na
internet em Filosofia Moderna
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